“SUS é um exemplo para o mundo”

Leila Krüger

Parece brincadeira (se você já teve de recorrer ao Sistema Único de Saúde – SUS), mas certo proeminente e antigo político disse, com todas as letras: “O SUS é um exemplo para o mundo”. E era em campanha eleitoral. E houve aplausos.

Quem precisa do SUS, ao contrário do dito cujo e de outros “proeminentes”, da política em especial, sabe que não é nada disso. O SUS é uma vergonha, vamos falar claro. E os recursos para a Saúde no Brasil, pífios (só há para as tais emendas parlamentares, aparentemente, dependendo da “necessidade”).

Recentemente, o vereador Cleuton Rolim, mais conhecido como “Beiço”, de Ijuí, Rio Grande do Sul, comentou em uma publicação sobre os absurdos com que deparou na mais recente visita a uma UPA – Unidade de Pronto Atendimento. E foi em Ijuí, até onde eu sei, um dos “ninhos” menos “desconfortáveis” para o pífio sistema de saúde pública brasileiro. Então, Beiço disse que “não gostaria de ver um familiar na mesma situação [dos pacientes que viu]”. Disse que “há problemas do acolhimento até o atendimento final”, em uma estrutura arcaica e insuficiente que – verdade seja dita, não é culpa (de muitos) dos médicos, apenas dos que são políticos, como muitos são.

Sei que há um alto índice de procura por atendimentos nas UPAs, e os sistemas de gerenciamento dessas instituições quase sempre, no Brasil, são péssimos. É certo que UPA deveria ser apenas para atendimentos de urgência, emergência, mas como saber diferenciar? Em um povo majoritariamente pobre, anafabeto funcional, e ainda tendo em mente que uma dor de ouvido pode ser algo fatal, ao passo que uma tontura incapacitante e dor forte no peito podem ser estresse – que é fator de risco para doenças físicas e mentais. Na dúvida, vá. E, como o SUS é gerido e mantido com dinheiro público, o seu, exija um atendimento de mínima qualidade. Faça perguntas. Cobre exames. Não seja refém daqueles médicos que têm culpa – esses sim – realizando “um atendimento a menos só por hoje”, “é só uma virose, tome paracetamol”.

Faltam fronhas, lençóis, máquinas, leitos – vimos muito disso na pandemia. Quanta gente morreu porque não havia cilindros de oxigênio (muito dinheiro foi desviado do oxigênio, averiguou-se!), respiradores, equipamentos, médicos, enfermeiros, auxiliares de enfermeiros, conhecimento de qualidade dos profissionais, atendimento dedicado, apesar da correria. Gente morreu sufocada, literalmente, pelo tal “exemplo para o mundo”, de Covid, e morre todo dia no SUS.

SUS. Exemplo, sim: de ineficiência e desumanidade. E o que é mais desumano que desviar dinheiro, ou reter dinheiro para a vida, designando-o para manobras políticas entre parlamentares ou financiamento de sistemas ditatoriais, ou corrupção, simplesmente? Quinhentos milhões de reais para cirurgias eletivas no SUS, com direito a festinha estatal, foi patético, no começo de 2023, por exemplo.

O que é você ficar quatro horas na fila, para ser atendido – de má vontade – em três minutos por um médico exausto e provavelmente adoecido receitando, sem exames, uma cirurgia para um caroço misterioso; tudo isso em uma salinha abarrotada de macas com gente meio viva, meio morta, tomando soro, com doenças contagiosas e não contagiosas, graves ou nem tão graves assim – quem se importa? Passei por isso ao acompanhar uma amiga, certa vez, ao Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Ela não tinha plano de saúde.

Sei de inúmeros casos, em vários lugares. Sei de médicos políticos cuja menor preocupação é com a vida alheia, aliás, até parece que “quanto mais esvaziar, melhor”.

Os médicos também ganham menos do que deveriam com o SUS. Planos de saúde são caros e faturam alto, mas são para poucos no nosso país. Faculdades de Medicina defasadas, notadamente as públicas, sem recursos públicos. Investe-se muito em Ensino Superior no Brasil, no papel, sim, a patamares de Primeiro Mundo, mas onde é que estão essas verbas? Se, nos rankings de Educação – e na prática – ficamos aquéns de países africanos miseráveis.

Falando em Educação, juntamente com a Saúde, é a base para um povo próspero e um país livre, em que, inclusive, críticas e discordâncias não sejam censuradas, nem fake news tidas como verdades por gente parcial e gananciosa. Temos, em 2023, a segunda máquina pública – em Brasília – mas pesada e onerosa do mundo. Para quê? Para ajudar o SUS e investir em Educação do modo como deveriam é que não é.

Eu digo: o Brasil não é um país pobre. Tem riquezas naturais “riquíssimas”, gente capacitada, empreendedores, criatividade, cultura, identidade. O Brasil é um país corrupto. E por isso é miserável, de várias maneiras.