A série de ocupações em terras deflagradas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), nas últimas semanas, desencadeou pelo menos três ofensivas no Congresso. Foram apresentadas duas propostas para punir, de forma mais severa, quem avança sobre a propriedade rural, além da mobilização para se instaurar uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar o MST.
Abril é considerado um mês fundamental para o movimento – a série de invasões que promove é conhecida como “Abril Vermelho” –, que voltou a atuar com a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em apenas três meses de governo, o MST promoveu 13 ocupações, mais do que todo o primeiro ano da gestão de Jair Bolsonaro.
Uma das iniciativas no Congresso contra o MST prevê excluir invasores de terras dos programas fundiários. O PL 1.373/23, do deputado Lázaro Botelho (Progressistas-TO), impede ocupantes de áreas não produtivas de planos relacionados à reforma agrária, à regularização fundiária ou a linhas de crédito voltadas para a pequena produção rural. A proposta tem apoio da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).
A FPA também articulou a unificação de três propostas para instaurar uma CPI que investigue o movimento – conta, até agora, com 172 assinaturas, uma a mais que o necessário para protocolar o pedido. O deputado Tenente Coronel Zucco (Republicanos-RS) conseguiu juntar os requerimentos dos colegas Kim Kataguiri (União Brasil-SP) e Ricardo Salles (PL-SP), mas a formação da comissão aguarda análise do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL).
Em outra ofensiva, o deputado Marcel Van Hattem (Novo-RS) busca o apoio da FPA para aprovar um requerimento de urgência para a apreciação do PL 8.262/17. A proposta permite a ação policial, sem a necessidade de ordem judicial, para retirada de manifestantes de propriedades, desde que seja apresentada escritura pública do imóvel, o que comprova a posse da terra.
Diferença
Segundo o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), ao longo dos quatro anos de mandato do ex-presidente Jair Bolsonaro foram registradas 62 ocupações de terra por movimentos sociais de reforma agrária. A maioria se concentrou no último ano, com 23 ocorrências.
Em 2023, ainda segundo o Incra, foram comunicadas à Câmara de Conciliação Agrária do órgão a ocupação de 13 áreas, e de outras seis administradas pelo Instituto de Terras de São Paulo (Itesp). O MST discorda desses números, mas reconhece que, em 2022, quando a estratégia de ocupações foi retomada graças à maior imunização contra a covid, houve 37 ações.
NO NORTE
Invasão, tortura, destruição e roubo. Essa tem sido a dura rotina vivida por produtores rurais do estado de Rondônia, um estado que está abrigando uma nova modalidade de conflito agrário encabeçado por grupos considerados extremamente perigosos e preparados.
No dia 21 de abril de 2021, a Fazenda Santa Carmem, a 190 quilômetros de Porto Velho (RO), foi invadida por cerca de 40 homens fortemente armados. Relatos de funcionários mostram que o grupo agiu com muita violência, inclusive com técnicas de tortura, e destruiu veículos e alojamentos, fugindo levando outros veículos e tratores.
Segundo o secretário de Estado da Segurança, Defesa e Cidadania de Rondônia, José Hélio Cysneiros Pachá, das cerca de 90 invasões em curso no estado atualmente, cerca de 30 são de grupos mais violentos.
Na Fazenda Santa Carmen, pichações indicam que a invasão foi feita A pela Liga dos Camponeses Pobres (LCP), um movimento que tem predileção pela guerrilha armada. “Com a pandemia, foi recomendado que se suspendesse a reintegração de posse. Atualmente, essas atuações criminosas estão usando o pano de fundo de movimentos sociais para causar terror nas propriedades. Eles entram, destroem as propriedades e retornam para essas terras em litígio, onde a Polícia Militar não pode entrar”, explica.
Segundo ele, quando esses grupos tomam posse da terra, eles acabam destruindo as áreas de preservação. “Quando conseguimos entrar nessas áreas de litígio, encontramos veículos roubados, fugitivos, também temos informações da prática de narcotráfico, armas de grosso calibre e outros crimes”, disse.
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Segundo o secretário, o grupo age de forma organizada semelhante a grandes quadrilhas das capitais, incluindo a prática conhecida como ‘tribunal do crime’, onde possíveis desertores podem ser julgados e condenados até à morte por sua deslealdade.
Outros casos
O caso da última semana está longe de ser o primeiro em Rondônia. A fazenda Novo Brasil foi e continua invadida há alguns meses e há relato de assassinatos de policiais na região, supostamente pelo mesmo grupo criminoso.
Na propriedade Nossa Senhora Aparecida, em Chupinguaia, o produtor que está lá desde 1991, relata que houve muita destruição e invasão desde agosto do ano passado. A propriedade permanece invadida.
“É uma coisa inexplicável. Só quem vive sabe o que tá acontecendo. Você está produzindo, plantando e colhendo, fazendo de tudo para melhorar o país e, de repente, do dia pra noite um bando de gente entra na propriedade, acaba com tudo ,queima a casa, o curral, o maquinário. Impede de produzir, cortam as pontes para que não se possa escoar a produção”, relata o proprietário Antônio Afonso, que diz que a sensação é de impotência: “Estamos à mercê desses bandidos”.
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